Marisa Batalha
(Foto: Facebook)

Depois de viralizar nas redes, nesta última quarta-feira (02), os ataques de racismo na internet contra a fotógrafa cuiabana, Mirian Rosa, de 32 anos - que registrou um boletim de ocorrência contra o autor dos xingamentos, Rafael André -, o Instituto de Mulheres Negras de Mato Grosso (Imune) manifestou nesta quinta-feira (03), seu repúdio contra a violência absurda racial.
O ato de racismo foi denunciado pela fotógrafa em sua página no Facebook e disseminado por amigos nesta quarta. Em particular, nos grupos de WhastApp, de Movimentos em Defesa aos Direitos da Mulher, Culturais e de jornalistas.
Por meio de nota, o Imune revela que Rafael violentou não somente uma mulher negra, mas à coletividade destas mulheres que, como Miriam, são trabalhadoras e ganham a vida às duras penas. 'Compondo, hoje no Brasil, a maioria entre as chefes de família. Assim, quando um indivíduo, visivelmente manifesta sua neurose, seu ódio racial e de gênero que a democracia racial teima em esconder, vê-se claramente, cada vez mais pessoas mostrando suas caras'.
Em conversa da fotógrafa com o Site Única News, Mirian revelou que os áudios enviados no celular de uma antiga amiga, a compara com um saco de lixo preto e carvão. “É o seguinte: vou queimar uma carne lá em casa. Preciso de você, como o carvão e o saco de lixo para recolher o que restar”.
Ainda de acordo com a fotógrafa, ela conheceu Rafael André na última segunda (30), durante um encontro com um grupo de amigas, em um bar de Cuiabá. Onde depois de poucas palavras trocadas, surgiu um desentendimento por motivos religiosos.
As ofensas de cunho racial foram realizadas no dia seguinte e ela acredita que a divergência religiosa pode ter motivado as ofensas, porém afirma que tal situação não justifica as declarações criminosas e que a colocam em constrangimento extremo.
Ela lembra que ao receber os áudios ofensivos, postados em um grupo com mais de 200 pessoas, não deu relevância, à princípio. “Eu ignorei os áudios dele, a princípio, mas depois ouvi novamente e fui me surpreendendo com tanta maldade. Aí tive a dimensão das ofensas que ele proferiu”, lamentou.
Mirian também acredita que a amiga que emprestou o celular para o acusado, pode ter sido conivente com ele. “Eu ouvia a voz dela, ao fundo, rindo da situação, enquanto ele me ofendia. Além disso, ela costumava me ofender, falar do meu cabelo e das minhas roupas”, lamenta.
Depois de ouvir todos os áudios, Mirian, indignada, compartilhou a situação com amigos, que decidiram divulgar as ofensas nas redes sociais. Posteriormente, a fotógrafa registrou um boletim de ocorrência contra o acusado. “Eu quero que ele pague por tudo o que me disse. Eu quero que ele seja preso. Foi um caso de racismo, porque não ofendeu somente a mim, ofendeu a todos os negros”.
Na carta de repúdio enviada para os mailings de sites e jornais, o Imune ainda lembra 'que o linguajar do homem - 'criola maldita, mucama, carvão' -, denota que existe ainda uma parcela da população brasileira que insiste em manter-se cega ao apoiar publicamente o conservadorismo e mesmo o retrocesso'.
Na carta, o instituto faz questão de frisar que há uma nova geração unida e bem informada de pessoas, que se apoia por meio de coletivos ou nas relações cotidianas.E que não aceitam mais caladas estas agressões. E assim pedem providências para que Rafael André, autor dos xingamentos raciais, seja preso. E que o crime seja caracterizado como racismo e não como injúria racial.
Além de medida protetiva e atendimento social e psicológico para a Mirian, garantindo que não seja oprimida pelo agressor ou familiares, visto que vivem no mesmo bairro.
Leia na íntegra a carta de repúdio
O Instituto de Mulheres Negras de Mato Grosso (Imune) vem a público manifestar o seu repúdio contra a violência racial cometida pelo Senhor Rafael André, que ganhou repercussão nas redes sociais nesta quarta-feira, ao proferir diversas ofensas raciais e de gênero rasteiras contra a fotógrafa negra Mirian Rosa, 32 anos, buscando difamá-la de maneira covarde, com xingamentos de baixo calão que não nos dispomos a repetir.
Este senhor violentou não somente uma mulher negra, mas à coletividade destas mulheres que, como Miriam, são trabalhadoras e ganham a vida a duras penas, compondo, hoje no Brasil, a maioria entre as chefes de família.
Tal indivíduo, visivelmente manifesta a neurose, o ódio racial e de gênero que a “democracia racial” teima em esconder, mas que tem cada vez mais mostrado as caras ultimamente.
Seu linguajar soa asqueroso, absurdo, revoltante, inaceitável e triste.
Denota a existência de uma parcela da população brasileira que, mesmo sendo negra (com elementos de origem indígena, como se pode observar na foto do agressor) insiste em manter-se cega ao apoiar publicamente o conservadorismo e mesmo o retrocesso.
Até quando ouviremos, atônitas, as expressões “criola maldita”, “mucama”, "carvão"???
Até quando seremos tratadas como sacos de lixo para as sua verborragia racista?
Diante de tamanha violência, repetimos o que disse Marielle disse: parem de nos matar ( física e simbolicamente)!
Fazemos parte da constituição da história e da memória deste país.
Nossas raízes ancestrais, nossa riqueza intelectual e nossa capacidade afetiva, nossa força e nossa união garantiram a sobrevivência do povo negro no Brasil. Somos construtoras de história, ainda que muitos não gostem de admitir.
Exigimos o mínimo (ou melhor, o máximo) respeito.
Por outro lado, a atitude deste cidadão nos mostra a necessidade urgente de que a população seja melhor esclarecida sobre suas origens, sobre a história do país e sobre a política nacional, sobre a importância do povo negro para a história, não querendo com isso dizer, que a falta de informação justifica a violência.
Falta informação e educação, falta debate sobre esta democracia racial em que convivem, simultaneamente, a discriminação racial e o elogio à raça. Triste contradição, que demanda urgente discussão, aqui em Cuiabá, onde compomos mais de 180 mil habitantes, sem a devida representatividade.
Mas, junto com os movimentos sociais, continuamos unidas e permaneceremos cobrando a prisão deste criminoso, além de medidas protetivas para a vítima, tendo em vista o eminente risco de novas agressões verbais e, quiçá, físicas.
Neste sentido, conclamamos que as autoridades competentes não façam vistas grossas à esta clara manifestação de racismo, insistindo em taxá-la de “injúria racial”, pois fomos coletivamente agredidas.
Em Mato Grosso, somos maioria entres as mulheres agredidas, e as mais frequentes vítimas dos feminicídios.
Este alerta partirá de Cuiabá para todas as entidades e coletivos com os quais o Imune mantém contato, a fim de que não se repita a violência cometida contra a vereadora Marielle Franco, nesta que é mais uma tentativa de apagar a figura da mulher negra batalhadora, bela, positiva e forte (características que tanto Mariele quanto Miram possuem), tentando devolvê-las “ao seu lugar”.
Mas as mulheres negras estão organizadas. Há uma nova geração unida e bem informada, que se apoia por meio de coletivos ou nas relações cotidianas. Não aceitaremos caladas mais esta agressão.
Nas palavras da poetisa PachaAna, “abaixa a crista, hoje é nóis que dita. As mina tão tramada e o jogo se inverteu”.
Portanto, cobramos:
1- A prisão para Rafael André
2- Medida protetiva e atendimento social e psicológico para a vítima, garantindo que não seja oprimida pelo agressor ou familiares, visto que vivem no mesmo bairro
3- Que o crime seja caracterizado como racismo e não como injúria racial
4- Que o agressor e sua família possam passar por formação/capacitação a respeito das temáticas racismo, violência racial, violência de gênero etc.
Continuaremos em luta! #paremdenosmatar
Cuiabá, MT, 3 de maio de 2018.
Instituto de Mulheres Negras de Mato Grosso (Imune)
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