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GERAL Terça-feira, 23 de Julho de 2019, 09:08 - A | A

23 de Julho de 2019, 09h:08 - A | A

GERAL / BLOG DO HELIO GUROVITZ

A lógica perversa de Bolsonaro

A incontinência verbal do presidente lhe custou poucos pontos na popularidade e, até agora, só tem contribuído para ampliar o racha na sociedade, de que ele próprio se beneficia



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Bolsonaro tem desferido ataques contra seus inimigos prediletos: esquerdistas, jornalistas, ambientalistas, cientistas, artistas... — Foto: Fátima Meira/Futura Press/Estadão Conteúdo

Ninguém informado jamais teve dúvida sobre quem é o presidente Jair Bolsonaro. Ao contrário, a agressividade verbal sempre contribuiu para sua popularidade no eleitorado fiel que cultiva há décadas – e para despertar a revolta no resto da população.

É o mecanismo de que Bolsonaro se alimenta politicamente. Num ambiente mais sereno, vozes como a dele seriam consideradas exóticas ou extremas, produto indireto das funções orgânicas naturais numa democracia saudável, onde vigora a livre circulação de ideias e a plena liberdade de expressão.

No nosso ambiente, em que os principais canais de comunicação são empresas digitais infensas a qualquer responsabilidade política, interessadas apenas em viciar os cidadãos nos estímulos produzidos por cliques e curtidas, as redes sociais permitiram que tal discurso se amplificasse e chegasse ao poder por via legítima.

Funcionou na campanha eleitoral. Funcionará no governo? Manterá Bolsonaro sua popularidade? Imporá sua liderança à custa dos ataques aos inimigos diletos – a esquerdistas, jornalistas, ambientalistas, artistas, cientistas, artistas, cineastas, nordestinos, e a todos os que, pela mera existência, alimentem o ressentimento na base fiel?

A lógica política desse tipo de ataque está baseada na polarização. Quanto mais revolta entre os adversários e mais aplauso entre os acólitos, melhor. Quanto mais fraturada a sociedade, mais benefícios ao demagogo. De Donald Trump a Rodrigo Duterte, de Vladimir Putin a Recep Erdogan, de Nicolás Maduro a Viktor Orbán, a receita no manual do populista é sempre a mesma: separar “nós” e “eles”; pôr a culpa dos males no “inimigo” e assumir o papel de herói em nome do “povo”.

Em todos os países onde tal lógica vem sendo aplicada via redes sociais, ela tem funcionado. Mesmo quando perde eleições, o populismo se torna incontornável e traz sua pauta para o centro do debate. Até (ou sobretudo) nas democracias maduras.

No Brasil, foi a mesma lógica perversa que dirigiu a estratégia do PT ao longo de todas as suas campanhas. Resultou, como efeito colateral da falência econômica e moral dos governos petistas, na ascensão de Bolsonaro. Enfim um antagonista à altura do papel de demônio de estimação do PT! Enfim alguém capaz de jogar o jogo da polarização em seus próprios termos!

E Bolsonaro está aí, a produzir todo dia motivos para indignação: o filho na embaixada, a agressão a Miriam Leitão, as mentiras sobre o desmatamento, o rol inesgotável de disparates com que alimenta diuturnamente os microfones ávidos por notícias. Embora os desatinos tenham lhe custado pontos nas pesquisas de popularidade, as consequências práticas até agora são nulas.

Os mesmos que se revoltam contra o destempero verbal do presidente, os mesmos que veem nele um risco à democracia, os mesmos que se indignavam contra Lula, Dilma e companhia, hoje parecem ainda mais irracionais. Depositam esperança em que a sociedade acorde do pesadelo populista e busque inspiração não na ira verborrágica de Lulas ou Ciros, mas nos pendores iluministas de Tabatas ou Hucks.

Em que lugar do mundo isso ocorreu? Não no Reino Unido do Brexit, não nos Estados Unidos de Trump. Para não falar em Rússia, Turquia, Hungria ou Filipinas. Em países democráticos, o centrismo acanhado, o liberalismo comedido, a oposição “construtiva”, os políticos herbívoros de outros tempos têm sido varridos por predadores carnívoros outrora relegados a nichos marginais, da estirpe de Bernie Sanders, Jeremy Corbyn ou López Obrador. Logo o Brasil seria exceção?

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