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ARTIGOS/UNICANEWS Quinta-feira, 03 de Setembro de 2020, 18:51 - A | A

03 de Setembro de 2020, 18h:51 - A | A

ARTIGOS/UNICANEWS / JOÃO VICTOR SIQUEIRA

Todos querem saber por que Isabele morreu

Única News



Há cerca de 60 dias, Cuiabá tem sido foco de um assunto que não me traz prazer algum falar sobre, mas é necessário. No dia 12 de julho de 2020, a garota Isabele, então com 14 anos, perdeu a vida.

As circunstâncias desta morte têm sido fonte de debate incessante desde o dia do seu acontecimento, com julgamentos apressados exarados pelos cidadãos, em evidente resposta à pergunta ainda não respondida: como e porquê Isabele morreu?

A despeito de ser uma pergunta que toda a população cuiabana, e mesmo do Brasil, após a exibição de matérias reiteradas sobre o assunto no Programa Fantástico, quer saber, no espaço temporal em que estamos, falando juridicamente, apenas o “como” é relevante.

Ontem, dia 02/09/2020, a Polícia Judiciária Civil apresentou seu Relatório Policial sobre o caso em Coletiva de Imprensa. Ao final da exposição dos delegados e peritos, a pergunta reiteradamente feita pelos profissionais de imprensa ali presentes se referiam aos “Porquês” do caso. Porque a adolescente B.O.C. teria feito isso ou aquilo. Porque o Sr. Marcelo Cestari teria feito tal coisa. E inúmeros outros porquês.

No entanto, para o leigo, é importante esclarecer que o ato publicizado na Coletiva de Imprensa de ontem é “limitado”. O relatório policial, etapa judicial onde estamos nessa busca pela verdade, deve sim apresentar qual a tipificação penal que entende devida aplicação ao caso submetido a sua apreciação.

Contudo, os motivos do agente indiciado, aqui entendidos como características subjetivas dos agentes apontados no Relatório Policial, apenas podem ser aferidos pelo Juiz, no julgamento da causa. E antes desse julgamento, ainda passará pelo crivo do Promotor do caso, que ele sim, decidirá sobre quais “tipos penais”, quais “crimes”, apresentará a denúncia.

No caso Isabele, estão todos questionando o motivo do crime. Contudo, é importante anotar que a PJC, através do Relatório Policial do Delegado competente, não precisa apontar o motivo para indicar o tipo penal correlato, ou seja, promover o indiciamento.

Independente de qual seja o motivo, ocorreram fatos que podem ser tipificados como crime. Se um crime existir, tal será declarado pelo Juiz de Direito da causa. E não pelo Delegado. A Polícia Judiciária, ao exercer a função a ela atribuída pelo ordenamento jurídico brasileiro, não tem compromisso com acusação ou defesa, mas apenas com a busca de verdade. Essa é a lei.

Seu primeiro objetivo deve ser não perseguir o criminoso, mas, principalmente, proteger o inocente. E o papel do relatório policial não é imiscuir sobre a vontade subjetiva do agente apontado. Mas sim apontar, considerando as diligências realizadas durante a fase investigativa, se há indícios de materialidade e autoria para atribuir a determinada pessoa o cometimento de ato tipificado penalmente.

Com a conclusão do inquérito que investiga a morte da garota Isabele, com o indiciamento de duas pessoas e ato infracional de dois adolescentes, um deles por homicídio doloso, mas sem o apontamento do motivo do crime, esta questão veio à tona.

No entanto, a Lei Federal n.º 12.830/2013, em seu art. 2º, §6º determina que: “O indiciamento, privativo do delegado de polícia, dar-se-á por ato fundamentado, mediante análise técnico-jurídica do fato, que deverá indicar a autoria, materialidade e suas circunstâncias.”

A expressão “técnico-jurídica” ali pontuada determina que não cabe à Autoridade Policial fazer a análise subjetiva da motivação emocional do fato analisado.

Assim, não tem o presente artigo a pretensão de afirmar ser ou não o indiciamento relatado no caso Isabele como correto ou equivocado. É muito cedo para isso. Unicamente, pretendemos fazer o necessário esclarecimento para que os cidadãos que buscam o “Porquê?” entendam que não cabe ao Delegado afirmar tal. À autoridade policial cabe apenas ditar o “como”, de acordo com seu entendimento e fundado nos elementos dos autos, até então colhidos.

As fases posteriores, com a Denúncia a ser realizada (ou não) pelo Ministério Público, e o superveniente recebimento da Denúncia pelo Juiz da Causa (ou não), sequer precisam manter a mesma tipificação penal elencada no Relatório Policial.

Portanto, antes de promovermos um “julgamento” antecipado, devemos aguardar as instituições incumbidas de realizar a apreciação do “Porquê?”, e sobretudo, respeitar o direito à ampla defesa e o devido processo legal de TODOS os envolvidos.

A Bíblia, em Provérbios 25:8, aduz: “Não seja apressado, querendo julgar um caso que você não conhece direito. Que acontecerá quando seu vizinho provar que você está errado?”

É um bom provérbio.

*João Victor Gomes de Siqueira é advogado em Cuiabá, sócio da Dias Lessa Advogados.

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