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POLÍTICA Domingo, 14 de Março de 2021, 14:15 - A | A

14 de Março de 2021, 14h:15 - A | A

POLÍTICA / ENTREVISTA ESPECIAL

Maria Helena Póvoas fala sobre futuro do judiciário e participação das mulheres

Euziany Teodoro, Aline Almeida e Abraão Ribeiro
Única News



Neste mês em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, o site Única News traz uma entrevista especial com a mulher que ocupa um dos cargos mais importantes de Mato Grosso: a presidência do Tribunal de Justiça.

Desembargadora Maria Helena Garglione Póvoas é a primeira mulher a ocupar o cargo em 27 anos e ainda conta com a retaguarda de outra competente jurista, a desembargadora Maria Aparecida Ribeiro, como vice-presidente. As duas comandarão o judiciário mato-grossense pelos próximos dois anos.

Neste bate-papo, ela fala sobre o futuro do judiciário, a atenção necessária à Primeira Instância, judicialização dos casos de saúde e, é claro, do papel das mulheres nesse novo cenário do judiciário. Confira a íntegra.

ÚNICA – O quanto precisamos avançar e o quanto avançamos para tirar a imagem de uma justiça lenta?
Des. Maria Helena: Essa sua pergunta me remonta aos tempos em que eu era presidente da Ordem dos Advogados do Brasil e estava sempre batendo às portas do Tribunal de Justiça, clamando por melhor estrutura na primeira instância, para que juízes e servidores pudessem trabalhar e produzir melhor. De fato, naquela época os processos tramitavam de forma muito lenta.
Mas nos últimos anos o Poder Judiciário intensificou a expansão do Processo Judicial Eletrônico e passou a adotar diversas ferramentas tecnológicas, como os robôs que ajudam a impulsionar o trâmite dos processos, além de modernas práticas de gestão das unidades judiciárias. Hoje o PJe está presente em 100% das unidades judiciárias do Estado e os processos em papel logo deixarão de existir. Ganhamos tanto em agilidade, que desde o ano passado estamos figurando entre o sétimo e oitavo lugar, entre os mais produtivos do país, concorrendo inclusive com tribunais de grande porte. Então, essa imagem de um Judiciário lento já ficou no passado.
Mas isso não significa que não precisamos evoluir. Tudo que é bom pode ficar melhor ainda, não é? Então, quando assumimos a presidência do Tribunal, decidimos dar prioridade à 1ª Instância, para onde estamos convergindo praticamente todos os nossos esforços de gestão.

ÚNICA – Quando a senhora tomou posse disse que a Primeira Instância seria prioridade. Porque?

Assessoria

Posse TJMT Maria Helena Gargaglione Póvoas

 


Des. Maria Helena: Entendo que a Primeira Instância é a porta de entrada do Poder Judiciário. É onde o cidadão mais carente nos procura, em geral com um problema que já tomou proporções preocupantes. Então, eu entendo que devemos sim, olhar com maior cuidado para a primeira instância. Estamos trabalhando para dotar as comarcas de melhor infraestrutura, não apenas física, mas de tecnologia da informação e de força laboral, com mais magistrados e servidores.

ÚNICA – A senhora pretende ampliar o número de juízes no Estado? Se sim, qual a quantidade prevista para ser chamada?
Des. Maria Helena: Estamos em fase final de um concurso para juízes, que só não foi concluído por causa da pandemia. Falta apenas a prova oral. Pretendemos chamar o número suficiente para sanar o déficit de juízes no estado, em torno de 25 magistrados.

ÚNICA – A inteligência artificial já é realidade em praticamente todos os estados do Brasil. Em Mato Grosso, o PJe já está em todas as comarcas. É um avanço, porém quanto ainda precisamos avançar?
Des. Maria Helena: Sim, já estamos usando a inteligência artificial para impulsionar processos. Trata-se de um avanço inimaginável há três ou quatro anos. O Poder Judiciário de Mato Grosso está bastante antenado às inovações e, com certeza, já estamos colhendo os frutos destes investimentos.

ÚNICA – Nos fale sobre a judicialização da saúde, que é um enorme gargalo na administração pública de modo geral. Que frentes o Tribunal de Justiça trabalha para reduzir esses números?
Des. Maria Helena: Infelizmente, a judicialização da saúde é um fato no Brasil. Mas temos que convir que o SUS é universal, atende a todos os Brasileiros, desde a saúde básica até os casos de altíssima complexidade. Mesmo com todos os seus problemas, o SUS é o maior e mais abrangente sistema de saúde do mundo. E, justamente por isso, às vezes a demanda é maior do que sua capacidade de atendimento ao tempo necessário, o que leva as pessoas a procurarem o Judiciário. E neste cenário a Vara da Saúde trouxe um gigantesco avanço, porque ela garante o atendimento ao cidadão, respeitando os valores cobrados no mercado e, como consequência, com economia para os cofres públicos. Antes da Vara da Saúde o magistrado não teria como checar se o valor apontado nos procedimentos médicos e que deveria ser bloqueado das contas do Estado, estava condizente com o mercado.

ÚNICA – Presidente, temos casos de corrupção diariamente nas folhas de jornais. Secretários de todas as esferas respondendo processos, sendo afastados. Na sua opinião, o que falta para que os interesses coletivos sobreponham os interesses individuais na vida pública?
Des. Maria Helena: infelizmente a corrupção ainda é endêmica no Brasil. Mas eu sou uma pessoa otimista por natureza. Acho que estamos melhorando a cada dia, a sociedade está mais atenta e fiscalizando mais os agentes públicos.

ÚNICA – Presidente, a senhora acredita que o uso de tornozeleira eletrônica seja de fato um mecanismo eficaz, já que observamos várias reincidências? O que precisa ser melhorado nesta ferramenta?
Des. Maria Helena: Diversas pesquisas já realizadas com esse tema mostram que o percentual de pessoas que violam a tornozeleira ou que reincidem no crime usando tornozeleira, é muito menor do que aqueles que seguem as regras estabelecidas para o uso do equipamento. Uma destas pesquisas foi feita pelo Núcleo de Pesquisas em Direito e Criminologia da UFRGS- Faculdade de Direito, em parceria com a Defensoria Pública do Rio Grande do Sul, em 2017.
Outro aspecto a ser observado é que o uso da tornozeleira é mais eficaz na reinserção social. É melhor adotar a tornozeleira do que abarrotar os presídios de gente, misturando aquele que apresenta menor potencial agressivo com aqueles que já estão inseridos no crime organizado. Há muitos anos se sabe que o sistema prisional brasileiro precisa melhorar muito, sob o ponto de vista da reinserção social. Hoje temos em praticamente todas as comarcas magistrados empenhados em projetos de reinserção social. Basta acessar as matérias veiculadas no Portal do Tribunal de Justiça na internet para ver os exemplos. Contudo, a sociedade também precisa contribuir, oferecendo uma segunda chance a quem errou. O preconceito torna muito mais difícil o recomeço.

ÚNICA – E as audiências de custódia? Acredita que elas aumentam aquela sensação de que polícia prende e a Justiça solta? O que as pessoas precisam entender sobre a audiência de custódia?
Des. Maria Helena: Esse é um tabu que precisa ser combatido. A polícia faz o seu papel ao prender as pessoas, é para isso que ela existe. Agora, cabe ao juiz analisar a prisão e o contexto em que ela foi realizada. Nesse momento o juiz vai analisar se a pessoa responderá ao processo em liberdade ou se permanecerá presa. Ocorre que a esmagadora maioria das prisões em flagrante são de crimes de menor potencial ofensivo. Aí, neste caso, o juiz é obrigado a determinar que o cidadão responda em liberdade, porque está na Lei. Mas isso não significa que o cidadão ficará impune, apenas que responderá em liberdade, conforme prevê o Código Penal, para o tipo de crime ou infração que ele cometeu. O Judiciário apenas aplica a lei, que foi feita pelo Poder Legislativo.

ÚNICA – Temos presídios lotados e na maioria comandados por facções. O sistema penitenciário parece tão frágil diante da real finalidade, a de ressocialização. É possível impedir que as facções continuem a mandar dentro e fora das unidades prisionais?
Des. Maria Helena: Eu vejo com muita esperança que em breve poderemos colher bons frutos por meio do programa Fazendo Justiça, do CNJ, que tem parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, Ministério da Justiça e Segurança Pública, na figura do Departamento Penitenciário Nacional. Agora em fevereiro assinamos o Termo de Cooperação Técnica 11/2021 com o CNJ, para a execução do Plano Executivo Estadual do Programa Fazendo Justiça. E temos aqui em Mato Grosso o Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (GMF), sob supervisão do desembargador Orlando Perri, que é muito estudioso e dedicado a essa causa. Tenho esperança que a soma de forças de diversas instituições possa vencer o crime organizado.

ÚNICA – O poder judiciário, juntamente com outras instituições, tem construído rede proteção à mulher vítima de violência. Mas temos presenciado crimes cada vez mais violentos e frequentes contra as mulheres. Porque os avanços ainda parecem pequenos diante de um problema tão grande?
Des. Maria Helena: A pandemia agravou essa situação. Devido ao desemprego neste período e à necessidade do isolamento social, muitas mulheres se viram obrigadas a permanecer no mesmo teto que o agressor. Mas o poder público e as prefeituras estão se estruturando para oferecer a ajuda necessária a estas mulheres, a fim de que recebam o apoio necessário para quebrar o ciclo da violência.

(Foto: TJ-MT)

desembargadora - maria helena póvoas.jpg

 

ÚNICA – Por falar em mulheres, gostaria que comentasse sobre este destaque que as mulheres vêm tendo e os espaços sendo conquistados. A senhora à frente do Tribunal de Justiça, sua vice, as mulheres na política, em cargos antes ocupados só por homens. Dá orgulho? Mas ainda precisamos avançar?
Des. Maria Helena: Vejo com muito orgulho a ascensão da mulher em cargos de liderança. Fui presidente da OAB aos 34 anos e depois me reelegi, em um cenário quase que completamente masculino. Depois, quando assumi o cargo de desembargadora havia apenas a desembargadora Shelma no Tribunal, os demais eram homens. O mesmo cenário se percebia nos demais poderes constituídos, com raros casos de mulheres em postos de comando. Hoje percebemos que as mulheres estão assumindo mais os espaços decisórios, mas ainda há muito o que caminhar neste sentido.

ÚNICA – Presidente, a senhora foi, por duas vezes consecutivas, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil. Venceu chapas formadas apenas por advogados homens, todos os eleitores praticamente eram homens. A senhora acredita e vê machismo dentro do Judiciário? E na sociedade como um todo? Há solução para isso?
Des. Maria Helena: Sim, da mesma forma que acontece lá fora, há um forte machismo aqui no Poder Judiciário. As instituições são reflexo da sociedade, assim como seus representantes. A solução é uma mudança de cultura, por meio de campanhas, da luta diária de homens e mulheres pela equidade de gênero e da maior participação da mulher nas agremiações, associações de bairro, Câmaras Municipais, prefeituras, governo etc.

ÚNICA – Gostaríamos que a senhora fizesse uma análise crítica do Poder Judiciário. Hoje temos o Judiciário que queríamos? O quanto evoluiu e o que precisa ainda evoluir?
Des. Maria Helena: O Poder Judiciário foi uma das instituições que mais evoluiu ao longo dos últimos anos, um avanço extraordinário, com certeza. Como eu disse, hoje temos o PJe em 100% das unidades judiciárias e, em pouco tempo, os processos em papel, os remanescentes, vão desaparecer. A Justiça está mais ágil e também muito mais produtiva. Com frequência pontuamos nos primeiros lugares em produtividade, no ranking do CNJ, que mede o trabalho dos tribunais durante a pandemia. Agora, as instituições sempre precisam avançar, todos nós estamos em constante aprimoramento. E estamos buscando mecanismos para isso.

ÚNICA – O que este biênio vai deixar de imagem para a sociedade em relação ao Judiciário?
Des. Maria Helena: Nosso lema já define a imagem que queremos deixar para a sociedade. Justiça Inclusiva: eficiência com equidade. Significa dizer que perseguimos incansavelmente a eficiência, sem perder de vista a inclusão e a equidade.

ÚNICA – É possível um estado de direito que respeite a população em primeiro lugar, garantindo saúde, educação, segurança, justiça, ou isso está muito longe de acontecer, quase uma utopia?
Des. Maria Helena: Creio que haverá uma melhoria lenta e gradual do capitalismo, que precisa ser revisto para reduzir as distâncias entre o muito rico e o muito pobre. Hoje temos diversos projetos da Organização das Nações Unidas neste sentido e a agenda 2030 é o principal deles. A Agenda 2030 busca, entre outros 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, erradicar a pobreza extrema no planeta. Busca-se o desenvolvimento sustentável, com foco no ser humano e na sua qualidade de vida. O Poder Judiciário também está atuando em parceria com o CNJ nos objetivos de desenvolvimento sustentável da Agenda 2030, naquilo que nos cabe.

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Carlos 14/03/2021

A sociedade não quer separação entre homens e mulheres. Lembro da sua declaração desastrosa sobre as custas : “ Tem que aumentar , produtor rural anda de carrão e não quer pagar ?” Quando falamos de mulher lembramos de sensibilidade , coisa que não demonstrou ter. Pelo visto já está fazendo campanha para a candidata do genro na OAB . Quer continuar a dobradinha , estamos de olho.

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1 comentários