Por Eduardo Mahon
Não se fala muito de sexo. Não, de fato, como o sexo é. Aliás, ninguém em sã consciência vira-se e diz à mulher – vamos fazer sexo? Por Deus, não! Uma frase dessas é inverossímil. Em verdade, não é preciso dizer nada, além de lamber o contorno da orelha de quem está ao lado. Em todo o caso, quem quer falar alguma coisa, à guisa de convite, dirá: vamos transar? Simples assim.
Antigamente, a coisa era ainda mais rasteira: vamos trepar? Não se trata de mera força de expressão. O transar tem um quê cândido, normal, uma leve bonomia. O trepar não. Quem trepa promove uma felação tão profunda que mais parece exame de endoscopia. Isso para não falar na estocada vigorosa do macho teso que, por trás, doma a mulher pelos cabelos desde os tempos do Australopitecos.
Quem convida para transar, não está disposto a aventuras eróticas. De outro lado, o sujeito que sussurra no ouvido da mulher – vamos dar uma bela trepada – é porque está imbuído das piores intenções, traços de fetiche ou mesmo uma fixação animalesca no esfíncter alheio. Estamos combinados: ninguém faz sexo como se diz nas escolas, nas rádios, nas revistas semanais de fofocas.
Ao esconder-se a realidade nua e crua, outras obviedades também ficam escamoteadas nesse linguajar asséptico: pênis, por exemplo. Com relação ao órgão sexual masculino, é o segundo exercício que proponho nesta crônica. Desafio me apontarem uma mulher que tenha dito, ao descer o zíper do parceiro: quero chupar seu pênis. Jamais! Isso é a mentira mais tosca de que se tem notícia. Pênis é como um nome científico, tipo Turdus rufiventris para nominar um sabiá laranjeira.
Na prática, o bicho é sabiá, todo mundo sabe que é sabiá e chama sabiá de sabiá! Então pênis nunca está na boca de ninguém, a não ser nas aulas de educação sexual, em matérias da mídia ou nos debates transmitidos pela tevê. Só se voltássemos para a Era Vitoriana – que, aliás, não diz respeito ao Brasil – para supor o diálogo: ponha seu pênis na minha vagina. Ninguém continua duro com essa formalidade, faça-me o favor! O terceiro e último exercício é simples.
Você homem, você mulher, que está lendo essa abusada crônica com um sorriso no canto da boca, imagine-se trepando loucamente com alguém e, depois do vai-e-vem de corpos, aproxima-se a hora do clímax. A mulher cavalgando, o homem sendo cavalgado, na hora extrema em que uma onda elétrica percorre o corpo, abre a boca e anuncia: vou ter um orgasmo! Esse é o suprassumo da hipocrisia. Ninguém tem um orgasmo como ápice de uma trepada: as pessoas gozam. Tudo indica que o verbo virou uma espécie de tabu. Só é aplicado, quando muito, para dizer “gozar a vida”, ou pior, “gozar férias”, "gozar aposentadoria". Negativo! Ninguém tem tesão na aposentadoria!
O homem, a mulher, todo mundo goza, graças a Deus. Dizer que vai ter um orgasmo é o mesmo que exclamar – puxa vida! – quando o mindinho vai de encontro com a quina do armário do quarto. Numa pessoa normal, o palavrão nasce, cresce, até que é cuspido pela boca: puta que pariu!, aí está o sentimento autêntico, maduro, sem meias verdades. Então, depois de esclarecer o que todo mundo já sabe, quero deixar aqui registrado o meu protesto contra essa literatura “chá das cinco”.
Aprendi que a arte, a verdadeira arte – inclua-se aí a literatura –não pode se apegar ao “bom gosto” das piadas de salão. Não há literatura de bom tom. Por isso, nesse minuto de sinceridade, aconselho aos escritores e, principalmente, leitores: sejam pusilânimes em matéria de sexo. Em português rasgado, em matéria de putaria o segredo é ser baixo. Não me refiro àquelas vilezas de caráter, postura condenável dentro ou fora da alcova, mas baixeza no sentido do descaramento, da sacanagem pornográfica. Falem a língua impublicável dos bons amantes! Entendido isso, entendido tudo. Ficamos assim: quem é bom de cama não suporta fazer sala, se é que fui claro.
Eduardo Mahon é escritor.
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