Diego Frederici / Única News
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Uma magistrada do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT) vem sacudindo o cenário político do Estado. Selma Rosane Santos Arruda, juíza da 7ª Vara Criminal de Cuiabá, é a responsável na primeira instância do judiciário pelo julgamento das pessoas investigadas na “Operação Sodoma” – esquema que investiga fraudes na concessão de incentivos fiscais a empresários e que levou o ex-governador Silval Barbosa (PMDB) a prisão.
Em conversa com a Única News, Selma afirma que o combate a corrupção é uma “aspiração social”, além de fazer críticas a composição do poder judiciário brasileiro dizendo que ele é “ muito fechado, pois de uma maneira geral ele é composto por pessoas antigas”.
Única News: Juíza, o poder judiciário tem um papel importante no combate a corrupção?
Selma Rosane Santos Arruda: Em primeiro lugar o judiciário tem que abrir mais sua visão, ele é um órgão muito fechado. Por tradição ele demora muito para mudar. Tem uma maneira de ver muito secular. Só recentemente os juízes ficaram mais ágeis, até porque não foi permitido juízes mais novos ingressassem nas carreiras, modernizando o pensamento e tornando o judiciário mais ágil. Mas em geral os Tribunais são compostos por pessoas que tem essa formação mais antiga. Isso tem engessado um pouco o processo penal no que diz respeito ao combate a corrupção. O processo penal existe para garantir ao réu a possibilidade de defesa. Em geral, o criminoso é hipossuficiente, é pobre, vem da favela, comete um delito e depois volta para a favela. O Direito Penal existe para proteger essas pessoas. Ocorre que no processo penal para combater a corrupção, você está lidando com poderosos, ricos, pessoas com grande poder político e influencia social. Se você aplicar esses princípios de proteção você está superprotegendo e com isso você está incentivando a impunidade. Alguns membros dos Tribunais ainda não se deram conta disso, e aplicam a mesma regra de proteção excessiva para essas pessoas. Elas não precisam dessa proteção, só a utilizam para procrastinar o andamento do processo. Nesse exato momento do Brasil, vejo a necessidade que os Tribunais acordem para tratar igual os iguais. Não se trata de forma igual coisas completamente diferentes, como a criminalidade de massas, essa criminalidade violenta, que é pobre e marginalizada. Não se pode tratar da mesma forma a criminalidade do colarinho branco.
Única: Você tem julgado pessoas poderosas no Estado. Já sofreu algum tipo de ameaça ou coação?
Selma: Isso é normal, faz parte da carreira. Todo juiz criminal numa parte ou outra da carreira acaba passando por isso.
Única: Em virtude do histórico das pessoas que você julga, muita gente diz que querem tirar você da operação Sodoma. O que você acha disso?
Selma: Existe toda uma discussão técnica nesse sentido. Eu não sei se existe realmente alguma intenção de me tirar da operação Sodoma. O que se vê tecnicamente no processo é uma discussão sobre o fato de eu ter ouvido um colaborador antes da homologação da colaboração. Mas a lei fala que o juiz, se achar necessário, deve ouvir o colaborador antes da homologação. Portanto, o que eu fiz esta previsto em lei e qualquer entendimento em sentido contrário está contrariando o que está expresso na lei, ainda que se apresente justificativas técnicas que são tidas como plausíveis, que tenham esse ponto de vista. Respeito a avaliação contrária e vou obedecer obviamente qualquer determinação. Mas se existe um conchavo político por trás disso, quero acreditar que não.
Única: Você possui aspirações na sua carreira, como por exemplo ocupar instâncias superiores da justiça? Pensa em ingressar na política?
Selma: Ultimamente, só ando pensando em me aposentar o ano que vem. Como no próximo ano terei esse direito de aposentadoria, vou guardar essa hipótese no meu bolso. No momento que eu achar que está na hora de sair eu tomo essa atitude. Por enquanto estou pensando que ainda estamos no meio de um trabalho, um trabalho extenso que vai demandar muita energia.
Única: Na sua avaliação a colaboração premiada é um instrumento importante para obtenção de provas?
Selma: Nós temos prova disso. Fatos que foram obtidos e apurados não por meio da colaboração, mas partindo dela, estão plenamente comprovados. Há processos que estão aptos para serem sentenciados por meio desse recurso. Não é uma questão de opinião e sim constatação: a colaboração premiada veio para ficar, é um instrumento de grande utilidade para apurar os crimes, sobretudo os de colarinho branco.
Única: Até pouco tempo, ter um ex-governador e um ex-presidente da Assembleia Legislativa presos era raro no Brasil. Você acha que a sociedade vem demandando por mais transparência do poder público?
Selma: Eu acho que é uma aspiração social, a sociedade não está aguentando mais esse tipo de coisa. Ao mesmo tempo que ela constata que determinados valores são subtraídos por políticos, e vê que não tem hospital para atende-la, e que sua rua está esburacada, por exemplo, ela exige mais. Por isso eu disse que alguns membros do judiciário precisam acordar, porque a sociedade já está para lá de acordada para combater esse tipo de pratica. Não podemos esquecer que não adianta ficar apenas alertas e cobrando. Precisamos também mudar algumas atitudes diárias. A imprensa também é importante, ela tem que divulgar, pois o assunto era um tabu na sociedade. Antes se dizia “rouba mas faz” . Hoje dizemos “João roubou, Pedro rouba” etc. Temos que mexer nessa ferida e acabar de uma vez por todas com essa sensação de impunidade.
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